Espetáculo de André Masseno investiga o que está por baixo das camadas de representações
Outdoor corpo machine está em cartaz amanhã e domingo, na programação do FID
O Fórum Internacional de Dança (FID) termina suas apresentações neste fim de semana. Entre as atrações de sábado e domingo está Outdoor corpo machine, de André Masseno, que se integra a uma das tendências mais importantes da dança contemporânea no Brasil: a investigação do que seria realmente o corpo do brasileiro por baixo de todas as camadas de representações preconceituosas sobrepostas a ele.
A lógica de Outdoor corpo machine é simples. André decidiu ir atrás do “homem”, não o ser humano cuja natureza os filósofos tentam definir há séculos, mas o corpo masculino que a mídia e a sociedade de consumo tentam vender o tempo todo. Os tijolos fundamentais sobre os quais Outdoor corpo machine é construído são imagens conhecidas dos espectadores: poses, posturas e atitudes que podem ser encontradas na publicidade, na pornografia, no imaginário construído pela indústria cultural. A maneira como o artista articula esses elementos produz alguns momentos hilariantes, mas, acima de tudo, tem sabor amargo por causa do retrato perverso que acaba construindo de nosso tempo e seu universo de representações.
É a maneira como André Masseno organiza esse material que dá força e sentido a Outdoor corpo machine. Ele trabalha, antes de tudo, com a ideia de acúmulo, de saturação. Quando o vemos macaquear uma pose de revista masculina, por exemplo, achamos graça. Quanto ele nos atinge com uma overdose de poses, a coisa começa a se tornar incômoda. Somos subitamente confrontados ao fato de que gostaríamos que aquele corpo fosse apenas um corpo (naquele sentido que a indústria adora vender, uma casca a ser vista, admirada, invejada), ao mesmo tempo em que precisamos enfrentar o fato de que se trata de uma pessoa com ideias e sentimentos próprios, problemas, contradições. É cômodo consumir corpos e suas imagens; perceber você mesmo como tal produz desconforto.
Ironicamente, é o André Masseno intérprete que quase põe a perder a criação do André Masseno criador. O intérprete é o próprio menino do Rio (com alguns anos de experiência a mais), jovem, loiro, lindo, musculoso – em resumo, seu corpo corresponde exageradamente à representação que ele mesmo pretende criticar. É possível que Outdoor corpo machine tivesse ainda mais força se apresentado por um intérprete totalmente diverso: envelhecido, grotesco, em completo desacordo com os padrões de corpo masculino propostos (impostos?) pela indústria cultural. Ao apresentar as mesmas poses, caras, bocas e gestos, seria capas de expor ainda mais o ridículo de nossa adesão a estereótipos. Não que faça muita diferença: com o que mostra no palco com seu performer específico, Outdoor corpo machine já contribui de maneira suficiente para o debate sobre os vícios de nosso repertório de representações.
FÓRUM INTERNACIONAL DE DANÇA Sexta, às 20h, A incerteza, Joana Wanner e Raul Corrêa (MG), Espaço Ambiente (Rua Grão Pará, 185, Santa Efigênia). Às 21h, (Not) a love song, Alain Buffard/ PI: ES (França), Teatro Sesiminas (Rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia). Sábado e domingo, às 16h, Brincos & folias, Balangandança Cia. (SP), Teatro Marília (Avenida Alfredo Balena, 586, Funcionários). Às 19h, Outdoor corpo machine, André Masseno (RJ), Espaço Ambiente. Às 21h, Um corpo que não aguenta mais, Marta Soares (SP), Teatro Klauss Vianna (Oi Futuro, Avenida Afonso Pena, 4.001, Serra). Ingressos: R$ 2 (inteira) e R$ 1 (meia).