O fator cultural está na raiz da união de todas as comunidades humanas. Povos capazes de manter e preservar suas tradições e valores demonstram-se sempre muito mais fortes e tendem a perenizar-se com mais vigor que aqueles nos quais as tradições inexistem ou são mais frouxas. Veja-se o caso de Israel, que mantém suas tradições há pelo menos três mil anos. O povo hebreu já passou por dissabores inenarráveis que vão desde a escravização por outros povos como os Egípcios e os Babilônios, passando pela Diáspora promovida contra eles pelos Romanos, chegando mesmo ao Holocausto Nazista durante a Segunda Grande Guerra. O mito multitudinário criado ao tempo de Moisés e mantido até os nossos dias com pouquíssimas modificações é fator primordial de sua poderosa coesão social.
Salto neste ponto a Guaxupé e encontro – surpreso – um potencial incrível na direção da preservação das tradições e valores culturais e sociais.
Sugerindo a jovens do Ensino Fundamental no Colégio Objetivo que fizessem uma pesquisa sobre a sua cidade, os brasões de suas famílias, os prédios históricos (“patrimônios tombados”), etc, vejo com tremenda alegria o entusiasmo do jovem em conhecer a sua cidade. Quem foi o cidadão que dá nome a esta ou àquela rua ou praça? Qual a sua importância para a história de Guaxupé? Quais as características do brasão da cidade? De onde vem o nome “Guaxupé”?
Fascinante ver jovens de 10, 11, 14 anos percorrendo a cidade, solicitando autorização para visitar prédios como o “Palácio das Águias”, cuja arquitetura surpreendente está a perder-se sem que seja protegido pelo Patrimônio Histórico do Município, jovens da quinta série (destaco, entre outros, o Tiago, a Maíra e o Pedro) elaboraram trabalho primoroso a partir de uma cuidadosa pesquisa de campo e ficam-nos algumas reflexões.
Guaxupé precisa EMERGENCIALMENTE de um museu e de uma biblioteca. Ecôo aqui as vozes de meus grandes Amigos Elias José e Moacyr Ferreira.
O mais curioso é o quão simples é a montagem de espaços desta natureza. A partir da existência de um espaço e profissionais dispostos a exercer atividades desta natureza, o Ministério da Cultura, as Secretarias Estaduais de Cultura e várias entidades privadas fazem doação de livros de altíssima categoria para a construção de uma biblioteca. O mesmo para o museu. A partir da identificação de um espaço apropriado (sugere-se uma edificação que se deseje valorizar pelo seu apelo histórico para o município) e, fundamentalmente, da composição de um conselho curador idôneo e responsável, composto por intelectuais notáveis do Município, coletar material para exposição no próprio município é tremendamente simples. Há dezenas de famílias que dispõem de material valiosíssimo do ponto de vista histórico, guardado consigo e anseiam avidamente pela oportunidade de colocar em exposição em local apropriado, com os devidos cuidados.
Com certeza, nas antigas fazendas de café há ainda documentação histórica de altíssima relevância, instrumentos e maquinário antigos, fotos, pinturas, objetos curiosos de outrora (berços antigos, tipógrafos, referências ao tempo em que a Ferrovia era o principal elo de ligação entre Guaxupé e o mundo, etc...)
Uma modesta sugestão
Em São José do Rio Pardo, cidade em que me radiquei há dez anos, temos o Museu Rio-pardense e a Casa de Cultura Euclides da Cunha, ambos são espaços destinados à preservação da tradição cultural da cidade há cerca de meio século. Eu mesmo fui diretor da Casa no período de 1997 a 2000 e fiquei fascinado ao lidar com a preservação cultural de um povo. Fizemos uma restauração no prédio que serviu de moradia a Euclides da Cunha quando ele, morando em São José do Rio Pardo, recompôs a Ponte Metálica e escreveu “Os Sertões”, Obra que completa cem anos de publicação em 2002.
Ocorre que, em São José, aqueles espaços são ligados ao poder público e, assim, a cada mudança política trocam-se as equipes e um trabalho que uma administração começou é interrompido pela seguinte, dando-se início a outro com prioridades diferentes, sempre em prejuízo de um mais eficiente e vigoroso desenvolvimento continuado na direção certa. Minha recomendação à cidade de Guaxupé, tão rica em cultura e tradições, tão ciosa de sua preservação cultural, é que o museu e a biblioteca nasçam a partir da iniciativa privada. Que se reúna um grupo de intelectuais, artistas, empresários, líderes comunitários e estudantis (diretores de escolas e de grêmios estudantis, etc) e amantes da cultura. Este grupo comporia o núcleo do Conselho Curador do Museu e da Biblioteca a nascer como uma Organização Não-Governamental, portanto sujeita apenas aos interesses da preservação cultural, não das idas e vindas do que Euclides da Cunha chamava de “contradanças políticas”.
A INCLUSÃO de todos os setores da sociedade, de todos os interessados na preservação cultural é fundamental. Dificílimo, quase impossível, incluir todos os intelectuais e artistas de valor a partir de propostas oriundas do mundo da política. Para que todos tenham vez, voz e voto, é fundamental que os espaços culturais a nascer o sejam, passe a redundância, a partir de uma Organização Não-Governamental, sem fins lucrativos e capaz de captar e ser a guardiã dos recursos necessários à preservação desta tradição.
Se de alguma forma a experiência deste escrevinhador puder ser útil, a cidade de Guaxupé pode contar com meus préstimos neste sentido.