Recebi o dinheiro só um mês. Estou num prejuízo de R$ 19 mil, fora o da minha mulher, que também entrou no negócio - Alessandro Soares Leite, corretor de seguros

O esquema de aluguel de contêineres em Minas Gerais já gerou prejuízos que devem superar em muito a casa dos R$ 5 milhões, cálculos preliminares feitos por advogados. Entre os clientes lesados pela empresa Brasil Container, sediada em Contagem, na Grande BH, há quem tenha vendido o carro para aplicar o dinheiro, pedido demissão do emprego para, com o acerto, levantar a grana para o investimento e até quem tenha vendido a casa.

A operação foi denunciada há uma semana, pelo Estado de Minas. O esquema se assemelhava aos conhecidos golpes da pirâmide, já que necessitava de multiplicar o número de clientes para fechar as contas. Em linhas gerais, a Brasil Container prometia um investimento com rendimento mensal de 7%, acima do oferecido pelas mais conhecidas aplicações financeiras. O risco, aparentemente, era pequeno: o cliente comprava um contêiner por R$ 5 mil e fechava um contrato de aluguel do mesmo contêiner, pelo qual receberia todo mês R$ 350. Para a Brasil Container, o negócio era interessante pela possibilidade de fazer o mesmo com empresas maiores, só que cobrando um aluguel maior, de R$ 500, por exemplo - em tempo: contêiner é o nome dado ao recipiente de metal ou madeira usado para o transporte de carga.

A reportagem novamente tentou falar com a direção da empresa sexta-feira, mas não obteve sucesso nas ligações. Até a semana passada, já havia quase 50 ações na Justiça contra a Brasil Container. O número, porém, é hoje bem maior, em várias comarcas da Grande BH. Segundo o advogado criminal Osmiler Kleber Sachetto Guimarães, apenas seu escritório já ajuizou 328 ações. Há casos de vários tipos.

Um dos mais dramáticos envolve a dona-de-casa Fabíola, que, receosa, pediu para não ser identificada por completo. Ela investiu mais de R$ 60 mil na compra de contêineres, em abril do ano passado. Recebeu os aluguéis até novembro, a exemplo dos demais clientes lesados. O dinheiro foi aplicado por Fabíola na esperança de comprar uma casa. "Fui de boa-fé, mas estou decepcionadíssima", diz a dona-de-casa. Ela agora mora com o marido e o filho na casa do pai, já que não tinha mais como pagar o aluguel. "Tive de recorrer à família, estou revoltada." Fabíola esteve várias vezes na sede da Brasil Container, em Contagem, tentando negociar uma saída que levasse à recuperação do seu dinheiro. Em vão.

Segundo Osmiler Guimarães, há quase uma dezena de casos de pessoas que venderam a casa ou pediram dispensa do emprego para viver do aluguel de contêineres. O jornal tentou falar com elas, mas, envergonhadas ou temerosas, elas preferiram não atender à reportagem. "Mas posso dizer que teve gente que veio aqui ao escritório e não parava de chorar, numa situação de quase miséria", diz o advogado. "Uma senhora até desmaiou."

O corretor de seguros Alessandro Soares Leite afirma ter perdido R$ 19 mil, depois de investir R$ 20 mil na compra de dois contêineres. Ele recebeu R$ 1 mil pelo aluguel apenas em outubro. A esposa, que comprou três contêineres a R$ 7,5 mil cada, recebeu por três meses. "Estou num prejuízo de R$ 19 mil, fora o da minha mulher", lamenta Leite.

Situação pior vive Simone, enfermeira formada recentemente. Aos 38 anos, está desempregada. Em setembro, vendeu o carro, um Gol, por R$ 13 mil e comprou um contêiner. A intenção era viver da rentabilidade até conseguir um trabalho. "Na hora, vi todo mundo se dando bem e pensei: Vou acreditar, vai dar certo pra mim também", relembra Simone. Segundo ela, o pai, Valdir, um aposentado que ganha salário mínimo, vendeu a kombi por R$ 22 mil para entrar no negócio. "Eu recebi um aluguel apenas. Meu pai, nem isso."

O autônomo Emerson Reis confiou na indicação do amigo - que realmente vinha ganhando dinheiro - e aplicou a bolada de R$ 159,5 mil em 29 contêineres. Recebia R$ 16 mil todo mês de aluguel. Durante nove meses foi assim. Em dezembro, a Brasil Container parou de pagar. "Estou chateado, mas pelo menos perdi menos, comparado a outras pessoas. E lembrar que teve gente que vendeu até caminhão para entrar nisso aí."

Saiba mais

Atraído por falsas promessas de altas rentabilidades, o investidor desinformado aplica seu dinheiro e acaba caindo no que ficou conhecido como golpe da pirâmide. Em vez de investir o dinheiro que recebe, o golpista ou o administrador do fundo usa parte do dinheiro de cada novo investidor para pagar os altos juros prometidos aos investidores mais antigos, ficando ele com o restante. O sistema começa a ruir quando a necessidade de aumento de novos investidores se torna insustentável, pois cada vez mais é preciso dobrar a base de clientes.