Vasto é o campo da literatura e das demais artes em geral. Em qualquer uma delas - é bom relembrar - o seu valor intrínseco apóia-se sempre, inegavelmente, na sua boa qualidade, submetida esta a posteriori ao crivo do SENHOR DOM TEMPO, o melhor e o mais severo juiz estético, em qualquer época ou parte do mundo. Ninguém o supera! Pois bem, apesar desta verdade irrefutável, infelizmente, ainda existem, aqui e acolá, escritores que se preocupam muito mais com a quantidade de suas produções e não hesitam em publicá-las a granel, ou seja, às toneladas. Tal não aconteceu com aquele até então obscuro tabelião francês Felix ARVERS (1806-1850)(Ver Foto). Escreveu pouquíssimo. O mais surpreendente de sua obra é que ela entrou para a literatura francesa - e até mesmo para a universal - com apenas um (!!!) soneto: "Mon âme a son secret, ma vie a son mystère" (Minha alma tem seu segredo, minha vida seu mistério). Outro exemplo de excelente poeta que teve a boa qualidade como vetor da sua ourivesaria poética foi o irrequieto, precoce e desditado ARTHUR RIMBAUD (1854-1891). Quando tinha apenas 13 anos, já era um voraz leitor dos melhores textos, embora não se tivesse deixado influenciar por nenhum deles, tendo anulado os efeitos do contato com as obras de Hugo e dos parnasianos. Seus primeiros versos foram enfeixados nas obras: Le bal des pendus (O baile dos enforcados) e Le bateau ivre (o barco ébrio). Entrou para a literatura francesa com apenas dois (!!!) livros de poesia: Illuminations (Iluminações) e Une saison en enfer (Uma estação no inferno). Verdadeiro oráculo dos poetas simbolistas, sendo considerado o precursor do surrealismo. Vida curta e trágica. Reduzida obra, porém fonte de inspiração e exegeses lúcidas. Ele aprendeu muito cedo aquilo que muitos esqueceram - ao longo de sua carreira literária - a observação proverbial "O bom perfume geralmente está nos pequenos frascos". Na literatura brasileira, apontam-se, dentre outros, alguns exemplos que testemunham o valor da boa qualidade: a) AUGUSTO DOS ANJOS (1884-1914), com apenas o seu famoso livro: Eu! b) RAUL DE LEONI (1895-1926) com Luz mediterrânea c) HUGO DE CARVALHO RAMOS (1895-1921), pioneiro do regionalismo literário goiano, com Tropas e boiadas. Uma curiosidade: Outros escritores escreveram muito, mas da sua vasta produção às vezes apenas uma ou duas obras vale (m) a pena. Quando eu fazia o Curso de Letras Neolatinas (UFBA), meu saudoso professor de Literatura Hispano-Americana, fiel leitor e admirador incondicional do escritor colombiano Vargas Vila (1860-1933) terminou me persuadindo a ler quase todas as obras deste autor: 1) Alba roja 2) Ante los bárbaros 3) Laureles rojos, 4) Los Césares de la decadencia 5) Los parias 6) La muerte del condor etc. Mas, eu me aproximei deste acervo literário atraído muito mais pela crítica externa, isto é, pelo fato de o autor ter vivido sempre no exílio, além de ser anarquista e desafiante. Confesso-lhes que suas obras mais divulgadas não repercutiram tanto no meu espírito, embora, uma delas, raramente citada, muito curta - quase um opúsculo - cabendo num bolso, chamou-me a atenção: El vuelo del cisne (O vôo do cisne). Ele descreve a desconfortável vida de um artista que vivia numa comunidade interiorana e nunca fora compreendido pelos seus concidadãos. E mais curioso ainda: Creio que apenas uma frase (!!!) daquela obra vale por toda ela, porque é a quintêssencia da produção literária do irrequieto colombiano: "As vezes, há muito mais heroismo em suportar determinadas pátrias do que defendê-las!"
