O empresário Daniel Dantas, dono do grupo Opportunity, está prestes a obter uma fatia de cerca de 3% na Valepar, controladora da mineradora Vale.
(Daniel Dantas, do Opportunity: vitória em processo arbitral iniciado em 2007 aumenta poder em controladora da Vale)
Por meio da Elétron, que hoje detém 0,03% da holding Valepar, Dantas foi declarado titular do direito de compra de uma parcela maior das ações da companhia por um valor abaixo do mercado. A decisão foi dada por uma câmara de arbitragem responsável pelo julgamento do litígio que envolve a Elétron, de um lado, e suas sócias na Valepar - Litel Participações e Bradespar -, de outro. A sentença arbitral está sendo contestada pela Bradespar na Justiça.
O processo arbitral teve início em 2007 e foi realizado pelo Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA). Em uma primeira sentença, em dezembro de 2009, Daniel Dantas teve reconhecido o exercício de opção de compra das ações da Valepar feito em 1997, durante e logo após o leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, como era denominada à época. A sentença parcial garantiu esse direito ao empresário. Ou seja, a Bradespar e a Litel seriam obrigadas a vender ações da Valepar à Elétron. Também estabeleceu que, em um segundo momento, os árbitros definiriam o valor e o montante das ações a serem transferidos a ele, o momento em que isso deveria ocorrer e possíveis indenizações por perdas e danos, após a produção de provas pelas partes envolvidas. Agora, no início de setembro, a câmara de arbitragem deu a sentença final da disputa.
Embora as decisões dadas em procedimentos de arbitragem sejam sigilosas, o Valor apurou que Dantas garantiu uma fatia em torno de 3% da Valepar, aumentando imensamente sua participação na holding, que até então era de 0,03%. A Valepar tem hoje 52,7% do capital votante da Vale e tem como acionistas a Bradespar, braço de investimentos do Bradesco, com 21,21%; a Litel Participações, sociedade de propósito específico que reúne os fundos de pensão Petros, Funcef e Funcesp, liderados pela Previ, com 49%; a japonesa Mitsui, com 18,24%; e a BNDESPar, com 11,52%, além do Opportunity, por meio da Elétron.
A reportagem apurou ainda que as ações da Valepar serão transferidas por um preço inferior ao seu valor de mercado - não tão inferior como Dantas pediu, mas ainda longe do valor atual das ações da Valepar, como Bradespar e Litel ofereceram. "A Elétron vai pagar um preço para receber as ações, um preço de opção corrigido até uma determinada data", afirmou uma fonte que acompanhou o caso.
Embora favorável a Dantas, a sentença arbitral negou seu pedido de indenização por danos morais e por perdas e danos decorrentes do período em que o executivo não pode exercer seu direito às ações. "A Elétron não ganhou o direito às ações pelo valor que ela queria", disse ao Valor outra fonte, que também prefere não se identificar. "Não ganhou tudo, mas ganhou uma parte substancial do pleito dela."
A disputa entre a Elétron, a Bradespar e a Litel teve início em 2007, quando a primeira foi à Justiça com a alegação de que teria direito à compra de uma parte das ações da Valepar em poder das demais empresas em função de um aumento de capital promovido em 2002, que teria diluído sua participação na Vale.
A Justiça decidiu que quaisquer divergências entre as empresas deveriam ser resolvidas por meio da arbitragem, prevista em uma das cláusulas do acordo de acionistas da Valepar, da qual Bradespar, Litel e Elétron são signatárias.
A arbitragem foi instaurada no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem em 2007, quando foi composto um tribunal arbitral formado por três árbitros. Bradespar e Litel escolheram Gustavo Tepedino e a Elétron indicou Mário Sérgio Duarte Garcia. Os dois advogados, por sua vez, escolheram o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Francisco Rezek para presidir o tribunal. Em 18 de dezembro de 2009, o trio de árbitros entendeu, por unanimidade, que a Elétron é titular do direito à opção de compra das ações previsto no acordo de acionistas.
A sentença parcial foi contestada pela Bradespar e pela Litel na Justiça do Rio de Janeiro. Ambas pediram sua anulação com o argumento de que o árbitro Francisco Resek estaria impedido de julgar o tema porque atuou na defesa de Daniel Dantas em Milão, na Itália. Pela Lei de Arbitragem, não podem atuar como árbitros pessoas que tenham relação com as partes e os indicados devem revelar, antes de assumirem a função, qualquer condição que possa provocar impedimento. As duas empresas conseguiram suspender a sentença parcial na Justiça, mas a liminar obtida foi cassada logo em seguida. Com isso, a arbitragem teve continuidade, ainda que Resek tenha renunciado a ela. Um novo árbitro foi escolhido pelas partes e, em 5 de setembro, foi dada a sentença final, que garantiu à Elétron o direito às ações.
Agora, a Bradespar foi novamente à Justiça pedindo a produção antecipada de provas, com a promessa de que ingressará com um novo pedido de anulação da arbitragem. O argumento atual para a produção das provas é o de que o novo árbitro - o francês Yves Derains - não reside no país, o que demandaria urgência na tomada de seu depoimento. A Bradespar ainda argumenta, no pedido feito à Justiça, que Derains, árbitro de renome com 35 anos de experiência que já esteve à frente da International Chamber of Commerce (ICC), não poderia fazer parte do procedimento arbitral porque não teria conhecimento do sistema jurídico brasileiro e proficiência no idioma nacional.
De acordo com a petição anexada ao processo pela defesa da Bradespar, a segunda ação anulatória a ser proposta em breve "pleiteará a anulação da decisão arbitral final porque ela sustenta a validade da primeira decisão, chamada de parcial", que também é contestada na Justiça em um processo ainda sem decisão final. A juíza Natascha Maculan Adum Dazzi, da 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, negou o pedido de urgência feito pela Bradespar e determinou a realização de uma audiência para o dia 22 de novembro.
Procuradas pelo Valor, a Bradespar e a Elétron não se pronunciaram sobre a disputa.
A Valepar é uma holding que controla a Vale com cerca de 33% do capital -- 52,7% das ações ordinárias (com direito a voto) e 1% das preferenciais. De 2002 - época do aumento de capital realizado na Valepar - até hoje, o valor de mercado da Vale teve um incremento de 443%, passando de R$ 38,789 bilhões para R$ 210,629 bilhões.
A Valepar não é listada na bolsa, portanto não existe cotação de mercado para as suas ações. Alguns analistas afirmam que, como a holding só possui ações da Vale, em sua maioria ordinárias, esse papel poderia ser usado como uma proxy para se chegar a um preço da Valepar. Em 2002, Vale ON estava cotada na casa de R$ 5 e, hoje, está acima dos R$ 40, conforme dados da Economática. Como a decisão da arbitragem ainda não foi tornada pública, não é possível saber a qual valor e quantas ações a Elétron poderá adquirir, aumentando, assim, sua participação na controladora da Vale.
Em seu formulário de referência, a Bradespar informa que a quantidade de papéis não poderá exceder 37,8 milhões de ações ordinárias da Valepar. Ainda sobre o processo arbitral, ela estima que esse poderá representar perdas de cerca de R$ 200 milhões, ou 2% do seu patrimônio líquido em 30 de junho, que era de R$ 7,74 bilhões.
Enquanto a disputa prossegue, a Vale anunciava ontem remuneração recorde aos acionistas em 2011, no valor de US$ 9,0 bilhões.