A tradição de oferecer uma virgem como sacrifício ao rio Nilo, considerada por séculos um costume dos habitantes do antigo Egito, nunca realmente existiu, de acordo com um renomado egiptólogo do país.
O Egito sempre dependeu das cheias do Nilo para a agricultura
"O mito da virgem do Nilo vem deturpando a imagem dos antigos egípcios", afirmou Bassam El-Shammaa ao jornal local Daily News.
Segundo a tradição, uma virgem era jogada ao rio anualmente para garantir uma boa safra. O Egito, país desértico, sempre dependeu das águas do Nilo para irrigar sua agricultura.
O ritual teria sido praticado até a conquista islâmica do Egito. Mas o estudioso contesta um documento histórico em que a tese do sacrifício aparece.
HISTÓRIA
O historiador Al Maqrizi (1364-1442) escreveu que, quando os exércitos árabes comandados por Amr Ibn El Aas invadiram o Egito em 640, os cristãos cópticos pediram a ele que o ritual anual de entregar uma virgem ao rio fosse mantido.
O árabe teria transmitido o pedido ao califa (a maior autoridade local da época), que teria proibido a prática e enviado uma carta ao último líder cóptico do Egito.
Na resposta, o califa determinava que, ao invés de uma virgem, a carta deveria ser jogada ao Nilo.
Bassam El-Shammaa contesta essa versão, afirmando que sacrifícios humanos seriam contraditórios com a tradição cristã.
"Os cristãos rejeitavam as práticas pagãs", afirma Shammaa, que contesta também a suposta resposta dada pelo califa, que, segundo o egiptólogo, "estaria em contradição com o comportamento de um líder muçulmano conservador".
"Não há nada que sugira seriamente que o mito seja verdade", acrescentou.
ORIGEM DO MITO
Para o historiador, o mito foi inventado pelo historiador grego Plutarco, que contou a história de um rei egípcio chamado Egyptos. O monarca teria oferecido sua filha como sacrifício ao Nilo para aplacar a ira dos deuses.
Plutarco afirma que o rei teria cometido suicídio logo após o episódio. Por sua vez, os egípcios teriam assimilado o costume, passando a sacrificar uma virgem anualmente.
Shammaa contesta o grego antigo dizendo que "não há evidência de nenhum rei egípcio chamado Egyptos".
O historiador afirma que o mito cresceu durante os séculos 16 e 17, quando visitantes europeus acompanhavam as celebrações de enchente do rio, em que uma virgem esculpida em argila era oferecida às águas.
Questionados porque o faziam, os egípcios diziam estar substituindo uma virgem de verdade por uma de argila. Mas, para Shammaa, isso não era verdade.
"O mito deve ter se espalhado como uma forma de atrair turistas", afirma o egiptólogo.
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