Em uma cidade que tem um feriado para os evangélicos (30 de novembro), seria normal imaginar que o Carnaval também abrisse espaço para eventos religiosos. Assim foram estes quatro dias de festa em Brasília (DF). Igrejas evangélicas e católica organizaram eventos para atrair os fiéis durante a folia. Especialmente os jovens.
Nada de blocos, desfiles ou shows. A rotina nas igrejas até incluiu música, só que gospel. A Catedral das Assembléias de Deus hospedou 800 jovens em sua Faculdade Evangélica durante os quatro dias do feriado, para a realização do congresso de mocidade. Cada um pagou R$ 20 por hospedagem mais refeições durante o que consideram um retiro espiritual.
"Aqui não é colônia de férias não. Os alojamentos são fechados durante o culto, pra ninguém desviar a atenção", diz, severo, o coordenador Sócrates da Silva. Ele explica que cada um tem que administrar o tempo para poder comer e tomar banho sem perder os compromissos religiosos. Para os congressistas, além dos compromissos, é preciso ter um tempo extra para a conversa com os amigos. "Aqui é uma confraternização de vários jovens que não acham graça na festa do Carnaval", explica Kelem Lago, 23 anos, que já participou de micaretas, mas há cinco anos frequenta o retiro da igreja.
"No Carnaval, a festa acaba às 4 da manhã e no outro dia já era. Aqui, a alegria é direto. E, se começa uma paquera, é duradouro, não termina com o feriado", afirma.
A Igreja Batista Atos de Vida organizou um acampamento em uma escola e reuniu 70 crianças e jovens. Além dos cultos, a agenda de atividades inclui teatro e dança "sempre com o evangelismo", explica a coordenadora do evento, Ester Almeida. "Nós somos evangélicos, então não é nosso estilo ficar pulando Carnaval. Você sai e talvez fique bêbado, arrume briga. Aqui, sabemos que não seremos agredidos, expostos, ridicularizados", ressalta.
Ela conta que a paquera rola entre os jovens, mas "com respeito". "A gente tem a piscina, por exemplo, e todo mundo brinca, mas sem o olhar de cobiça. Também separamos as barracas dos meninos e das meninas", diz.
Daniel Soares, 17 anos, mora perto da escola que abriga o evento, mas resolveu acampar por lá durante o feriado. "Aqui ninguém briga, ninguém bebe, é mais família", destaca. "E tem muita coisa pra fazer. Eu tô com a perna doendo porque dancei muito. A gente também faz luau, joga basquete. E o intuito é esse mesmo, sair um pouco dessa bagunça do Carnaval".
Ele divide a barraca com dois colegas, um de 25 e outro de 10 anos. Fora a bagunça, diz que não há briga. Até porque todos têm o mesmo interesse e ninguém sente falta do Carnaval. Só João Philippe, o caçula da casa, está com saudade de algo que está fora do retiro: "Eu sinto falta do vídeo-game", confessa.
Rebanhão
O movimento de Renovação Carismática organiza pela 23ª vez o Rebanhão, evento religioso realizado sempre durante o Carnaval. "Esta data é importante como preparação para o início da quaresma, na quarta-feira de cinzas, e também como opção para o jovem, já que o Carnaval perdeu seu lado folclórico, de brincadeira de rua e hoje está fora de alguns valores morais e éticos da igreja. Não é um evento para católicos", diz Herculano Marinho, coordenador do movimento em Brasília.
Ele acredita que a missa de encerramento do evento, na tarde desta terça, que deverá ser comandada pelo arcebispo de Brasília, dom João de Aviz, deve lotar o ginásio Nilson Nelson, que tem capacidade para cerca de 12 mil pessoas.
O evento também conta com programação especial para crianças, o Rebanhinho. As brincadeiras são intercaladas com missas realizadas com marionetes, para entreter o público mirim. Os pais podem acompanhar as atividades. Céldia Matos levou os filhos Marlon, 4 anos, e Maylla, 8 anos, para o passeio que já é tradicional. "As crianças brincam aqui à vontade e a gente fica tranquila", diz. "Eu já cheguei a ser rainha de Carnaval na minha cidade, no interior de Minas, mas acho que as pessoas bebem demais nas festas. O que a gente faz aqui mostra que pra ser alegre e se divertir não precisa encher a cara", compara.
Relações públicas do evento da Assembléia de Deus, Ezequiel Pereira também afasta a idéia de que os retiros são chatos. "O pessoal brinca, joga bola, revê os amigos. Não é só caretice", afirma, também esperando para esta terça o dia mais cheio do evento especial de Carnaval. Como os cultos são abertos para o público em geral, não apenas para os jovens que estão no retiro, ele contabiliza que cerca de 25 mil pessoas devem passar pela igreja nestes quatro dias.
Tudo, para reforçar a mensagem para os jovens. "Em vez de ficar por aí fazendo o que não deve, eles ficam aqui protegidos", conclui.
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