Uma denúncia de agressão a duas crianças brasileiras em uma escola de Madri reacendeu na Espanha a polêmica sobre xenofobia nas instituições de ensino do país. A empresária paulista Mônica Patusca afirmou que seus filhos, Carlos Henrique, de 12 anos, e Ana Karina, de 9, foram alvo de agressões físicas e xingamentos racistas por parte de outros alunos do colégio pelo fato de serem estrangeiros.
A empresária brasileira pediu ajuda do consulado em susposto caso de xenofobia.
O caso ganhou destaque na imprensa espanhola e levou o governo da Espanha a reconhecer que estudantes imigrantes são alvo de xenofobia nas escolas do país.
Mônica, que mora com os filhos na Espanha há quatro meses, disse à BBC Brasil que Carlos Henrique "chegou em casa com as pernas roxas várias vezes", afirmando ter sido agredido por um grupo de garotos da própria turma, da 7ª série do colégio Enrique Tierno Galván, em Madri.
Segundo ela, o filho está fazendo tratamento psicológico para suportar "uma perseguição xenófoba que acontece desde o primeiro dia de aula, com xingamentos e violência física".
Mônica contou ainda que chegou a prestar queixa na polícia com um boletim médico, mostrando que a filha sofreu agressão física durante o recreio. Ela também pediu ajuda ao consulado brasileiro em Madri, que mandou uma carta à escola relatando a reclamação da mãe dos alunos.
Segundo a empresária, que mora em Madri com os filhos desde dezembro de 2008, o colégio não tomou providências. Procurada pela BBC Brasil, a escola Enrique Tierno Galván não respondeu às acusações. A diretora Elena Maria Perex disse que a instituição "não faz declarações à imprensa".
PESQUISA
A denúncia de Mônica trouxe de volta ao país a preocupação com casos de xenofobia nas escolas espanholas. Um relatório de especialistas em educação e sociologia confirmou recentemente a situação vulnerável dos estudantes imigrantes. Segundo o informe do Observatório Estatal de Convivência Escolar - feito pelo Ministério de Educação no segundo semestre de 2008 - há grandes índices de rejeição dos estudantes espanhóis em relação a alunos estrangeiros.
Baseado numa pesquisa feita com 23.100 estudantes e seis mil professores do Ensino Fundamental de 300 colégios, a conclusão é de que os alunos espanhóis são pouco tolerantes para com os imigrantes. Quase a metade dos consultados, 46%, diz que prefere não fazer trabalhos escolares com companheiros latino-americanos.
Dois terços dos alunos afirmaram ainda que optariam por não estudar ao lado de ciganos, judeus ou marroquinos. Dos coletivos de imigrantes, os únicos bem-vistos são americanos e europeus ocidentais.
Segundo o ministério, o estudo tem como objetivo revelar as barreiras existentes a um convívio pacífico entre estudantes imigrantes e espanhóis, e criar "novas bases para resolver o problema".
Mas os autores do relatório admitem que a política de integração está falhando.
"Os coletivos imigrantes estão sob um grande risco de sofrer intolerância em seus âmbitos de atuação e, o que é mais grave, não houve melhora alguma dos últimos anos para cá em nenhum dos métodos de integração e informação", disse à BBC Brasil a diretora do informe, Maria Diaz-Aguado, catedrática de Psicologia da Educação da Universidade Complutense de Madri.
FALHAS
A pesquisa revelou ainda que professores e alunos não estão de acordo com a orientação dada nas escolas sobre racismo e xenofobia. Apesar de 90% dos docentes terem respondido que seus colégios estão trabalhando para dar uma boa acolhida aos estudantes estrangeiros, 64% dos alunos acham que isso não é o que acontece. Sete entre dez alunos disseram que não têm boa formação ou informação sobre racismo e xenofobia, nem sabem o bastante sobre tolerância e respeito a outras culturas.
O informe também abordou a violência nas escolas, indicando que 80% dos estudantes são contra agressões racistas e xenófobas e 8% são favoráveis. Uma pequena parte dos alunos inclusive admitiu a participação em atos de violência dentro dos colégios 3.4% disseram ter sofrido agressões físicas ou verbais e 2.4% disseram já ter agredido alguém.
Entre os agressores, 18% afirmaram que a cor da pele é um fator relevante para cometer um gesto violento e que ciganos e imigrantes são "alvos mais fáceis", principalmente os menores porque "circulam sozinhos e não se defendem".
"A escola é um microcosmos que responde à sociedade ao redor. Que haja casos de agressões físicas e verbais é gravíssimo", disse à BBC Brasil, Mariano Fernandez Enguita, catedrático em Sociologia pela Universidade de Salamanca e co-autor do informe.
Ele afirmou ainda que a Espanha "passa por um momento de ressaca da imigração alentado pelo debate político e a crise econômica" e que a solução está em criar políticas educativas que promovam a convivência.
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